Acidentes com aeronaves que transportavam urânio empobrecido como lastro já ocorreu em, pelo menos, três ocasiões. A primeira foi na ilha de Tenerife (Espanha), em 1977, em uma das maiores catástrofes aéreas da história da aviação, com 563 mortos, quando dois Boeing 747 colidiram na pista de decolagem.
Em outubro de 1992, poucos minutos após a decolagem, no aeroporto de Amsterdã (Holanda), um Boeing 747 perdeu dois de seus motores e atingiu dois prédios residenciais, causando um grande incêndio e a morte imediata de 43 pessoas. As autoridades locais declararam que o cargueiro empregava como lastro cerca de 280 kg de urânio empobrecido, sendo que, dessa quantidade, cerca de 150 kg nunca foram encontrados, levantando a hipótese de que tenha sido queimada no incêndio e liberada na atmosfera na forma de partículas.
Nos anos seguintes ao acidente, foram registrados vários casos de pessoas com problemas físicos e mentais na área vizinha ao acidente. Inicialmente, esses quadros foram atribuídos aos produtos de queima de substâncias perigosas à saúde humana transportada pelo avião, especialmente o urânio empobrecido. Mas um estudo de 2000 demonstrou que o risco daquela população exposta aos aerossóis e aos produtos de queima do avião foi muito baixo e que os casos descritos não tinham relação com o acidente.
Em um terceiro acidente, próximo ao aeroporto de Stanstead (Inglaterra), outro Boeing 747 carregando urânio empobrecido caiu minutos antes do pouso, espalhando seus destroços por uma grande área.
Modelos de Laboratório
Estudos feitos nos Estados Unidos mostram que, nos locais onde armamentos contendo urânio empobrecido foram empregados de modo mais sistemático, o contato de seres humanos com esse metal ocorreu, basicamente, de dois modos:
Exposição aguda por inalação ou ingestão de aerossóis, vapores ou poeiras;
Exposição crônica devido à presença de fragmentos de projéteis inseridos em tecidos do corpo humano.
As informações disponíveis sobre os efeitos biológicos do urânio empobrecido são poucas, e a disponibilidade dessas informações é muito limitada, o que dificulta a determinação precisa dos possiveis riscos da exposição a esse metal. Efeitos carcinogênicos e mutagênicos (respectivamente, que causam câncer ou mutações no código genético de um organismo) induzidos por fragmentos de projéteis retidos no corpo ou em partículas inaladas já foram descritos em modelos de laboratório.
Condenado ou absolvido
Enquanto a mídia e a pesquisa científica mantêm o foco nos possíveis efeitos do urânio empobrecido sobre os soldados da Otan, bem como nos veteranos de guerras dos últimos 15 anos, muito pouca atenção tem sido dada às populações civis altamente expostas a esse metal, como é o caso daquelas no Iraque, nos Bálcãs e no Afeganistão. Os soldados da Otan, bem como famílias deles, não estarão expostos ao urânio empobrecido ao longo da vida, diferentemente dos civis desses países, que foram ou são forçados a conviver com crateras produzidas por bombas ou mísseis e, portanto, estão expostos continuamente ao ar, à água ou ao solo contaminados ao redor deles.
Apesar de grande parte das informações indique que o urânio empobrecido não ofereça risco radiológico, devemos pensar sobre os riscos da exposição dos civis em longo prazo. A leucemia, induzida por radioterapia, por exemplo, desenvolve-se normalmente após um período de latência de dois a três anos, embora nesse caso se trate de uma exposição aguda e em altas doses. Evidências obtidas da população de Hiroshima mostraram que o período de latência média para o desenvolvimento dessa doença é de 10 a 15 anos – mas, novamente, se trata de uma exposição aguda em doses altíssimas.